O
texto a seguir é um trecho editado do ensaio de Henrik Bogdan
'Chalenging the Morals of Western Society: The Use of Ritualised Sex
in Contemporary Occultism'
publicado
pela primeira vez em The
Promegranate 8,2, Equinox Publishing, 2006.
Em
1949, um dos ex-discípulos de Crowley, Gerald J. Yorke (1901-1983)
publicou um pequeno artigo chamado “Tantric Hedonism” em The
Occult Observer em
que foi afirmado que certas técnicas sexuais utilizadas por iogues
tântricos para fazer um elixir eram conhecidos pela O.T.O.:
Iogues
tântricos que seguem esse caminho insistem que os processos físicos
estão envolvidos. Para eles, sêmen (bindhu) é a forma grosseira de
uma essência sutil chamado ojas que é a Águia Branca dos
Alquimistas. Amrita não está normalmente presente no corpo humano,
mas é produzido pelo casamento das Águias Branca e Vermelha;
todavia, sua produção é essencial para a sublimação do corpo
sutil, sem a qual o corpo final da alma, ou melhor, o espírito (atma)
com Deus (Atman), torna-se impossível. Dois métodos são ensinados por
este Elixir, um
a três óleos e mudras
da Hathayogins, que são desconhecidos para a tradição ocidental, a
outra no círculo Kaula do Bhairavi Diksha, quando a Suvasini dança
nua. Esta última técnica é conhecida no ocidente e é o secreto
tesouro de uma Ordem Hermética conhecida como a O.T.O. (1)
Yorke
não estava sozinho na tentativa de conectar a O.T.O. com Tantra
Hindu naquele momento. De fato, um ano antes, em 1948, Kenneth Grant
tinha publicado um Manifesto
do Ramo Britânico da Ordo Templi Orientis na qual ele afirma que, entre outras coisas, a Ordem
promulgou os ensinamentos essenciais do Shakta Tantra Shastra
indiano:
Na
O.T.O. são promulgados os ensinamentos essenciais da Tradição
Draconiana do Egito Antigo, os ensinamentos do Shakta Tantra Shastra
indiano; os ensinamentos da Gnose pré-cristã, a Tradição
Iniciática Ocidental conforme consagrada nos mistérios da Santa
Qabalah, e a Fórmula Alquímica Mística e Mágica das Escolas
Arcanas do passado milenar, bem como o modo de aplicar praticamente
os princípios essenciais subjacentes às Ciências Espagíria ou
Hermética, os Mistérios Órficos e do uso da Corrente Ofidiana. (2)
Grant
conheceu Crowley pela primeira vez em 10 de dezembro de 1944, em uma
casa onde Crowley estava hospedado na época, e logo tornou-se
secretário de Crowley, bem como um membro da O.T.O.. Um ano após a
morte de Crowley, Grant foi formalmente reconhecido como um membro do
Nono grau por Karl J. Germer (1885-1962), que sucedeu Crowley como
cabeça internacional da O.T.O., e em 05 de março de 1951 Germer
emitiu uma carta a Grant para abrir um “campus” (campo) da ordem,
em Londres. Como a Loja Nova Ísis (New Isis Lodge) era o único
corpo patenteado da O.T.O. na Inglaterra na época, parece que Grant
interpretou a patente, como tornando-o cabeça da “Ordem na
Grã-Bretanha”, (3)
embora a Loja Nova Ísis, na verdade, “não estando em andamento até
1955”. (4)
No entanto, em 20 de julho de 1955 Germer formalmente revogou a carta
patente e expulsou Grant da O.T.O. por causa de um manifesto que
Grant tinha emitido no mesmo ano. (5)
O
manifesto em questão era um panfleto de oito páginas, intitulado
Manifesto
da Loja Nova Ísis - O.T.O.,
em que Grant, através da O.T.O. com seu nome Frater Aossic IX°, foi
identificado como o Cabeça Interno da Loja Nova Ísis e da O.T.O.
(Ramo Britânico), usando o nome de O Mestre Nodens X° para esta
função. Grant aparentemente fez pouco da carta de expulsão de
Germer e continuou a operar a Loja Nova Ísis até 1962, com base em
poderes do “plano interior”. (6)
Também foi nessa época que Grant mergulhou na filosofia hindu e
religião, e durante o período de 1953-1961, ele escreveu uma série
de artigos sobre Advaita Vedanta para jornais indianos, como o The
Call Divine,
publicado em Bombaim. (7)
Ao que parece, neste momento Grant tornou-se um seguidor de Bhagavan
Sri Ramana Maharshi (1879-1950), conhecido como o Sábio de
Arunachala.
Grant
se tornaria mais tarde um instrumento no renascimento de Aleister
Crowley através da edição (muitas vezes em conjunto com John
Symonds) e introdução de uma série de livros de Crowley, incluindo
The
Confessions of Aleister Crowley
(1969), The
Magical Record of the Beast 666
(1972), The
Diary of a Drug Fiend
(1972), Moonchild
(1972), Magick
(1973), Magical
and Philosophical Commentaries on the Book of the Law (1974),
The
Complete Astrological Writings
(1974), e por escrever uma introdução ao The
Heart of the Master
(1973). Foi também durante este período que Grant começou a
publicar suas três assim chamadas Trilogias Tifonianas que iniciaram com
The
Magical Revival
em 1972, que foram completadas 20 anos mais tarde com o The
Ninth Arch
(2002). (8)
Os anos setenta também viu o início da, o que é normalmente
referido como, a O.T.O. Tifoniana sob a liderança de Grant, com o
anúncio oficial publicado pela primeira vez por volta de 1973.
Embora o sistema de graus fosse basicamente o mesmo que o utilizado
por Crowley, Grant descartou o uso de rituais de iniciação e, em
vez disso conferiu graus baseados no desenvolvimento pessoal dos seus
membros. O desenvolvimento foi aparentemente marcado pelo próprio
Grant, e esperava-se que os membros lhe enviassem os registros
ou diários que cobrissem suas práticas mágicas em uma base
regular. Tal como aconteceu com Crowley, a magia sexual foi confinada aos Oitavo, Nono e Décimo Primeiro graus, mas a natureza destes
diferenciam.
Por
sua própria conta, Grant tinha em 1944-1945 escrito uma série de
documentos como sugestão de Crowley, e um deles era sobre o tema da
magia sexual. Crowley ficou aparentemente bastante impressionado por
isto, admitindo Grant para o IX°. (9)
Esta iniciação foi mais tarde complementada com instruções
secretas tântricas de David Curwen (que se tornou um IX°, em 1945).
Ao estudar estes documentos Grant veio a perceber que o conhecimento
de Crowley sobre Tantra sexual era limitado, senão errado mesmo. De
acordo com Grant, estes documentos foram os mesmos que Curwen
havia emprestado à Crowley, em 1945, os quais são descritos por
Grant como um comentário sobre a Anandalahari. (10)
Curwen parece ter tido um efeito duradouro sobre Grant, e foi através
dele que Grant afirmou ter recebido 'iniciação completa em uma
fórmula altamente recôndita do vama marg Tantrico.' (i.e. caminho
da mão esquerda). (11)
Após a morte de Crowley, Grant tomou para si mesmo a retrabalhar a
magia sexual da O.T.O. ao longo do que ele considerava ser os
princípios tântricos, ainda que, ao mesmo tempo, tentando
reorganizar todo o sistema da Ordem. A reorganização consistiu
basicamente da fusão da O.T.O. com outra das Ordens de Crowley, a
A.˙.A.˙., mas de acordo com o próprio Grant esta falhou, e logo as
intimações de uma nova loja ofuscaram todos os seus planos, a Loja
Nova Ísis. (12)
A
Loja Nova Ísis da O.T.O. em Londres, foi fundada por Grant em 1955 e
esteve ativa até 1962, e foi nesta loja que o Tantra Indiano estava
conectado à magia sexual da O.T.O. , pela primeira vez de uma
maneira sistemática. (13)
As experiências mágicas realizadas pela Loja Nova Ísis parece ter
tido um efeito duradouro sobre Grant, que mais tarde seria baseada
amplamente na sua chamada Trilogia Tifoniana no seu tempo com a Loja.
Foi durante esse período que dois textos-chave no sistema mágico de
Kenneth Grant foram recebidos como resultados de rituais realizados
na Loja Nova Ísis: Wisdom
of S'lba
(14)
e OKBISh, ou The
Book of Spider.
(15)
É interessante notar que, aparentemente, Grant havia interpretado
certas passagens de The
Book of Spider
como referindo-se a David Curwen, e que considerou Curwen ter sido um
fator importante na sua iniciação. Nas Trilogias Tifonianas, além
disso, Grant escreve extensivamente sobre o seu sistema de magia
sexual, particularmente em Aleister
Crowley and the Hidden God
(1973) e Cults
of the Shadow
(1975). Tal como acontece com Crowley, o Oitavo grau lida com
masturbação e o Nono grau com o sexo heterossexual enquanto o
Décimo Primeiro grau, em contraste com o sistema de Crowley, não
lida com o sexo anal, mas com o sexo heterossexual durante o qual a
mulher está menstruada. Segundo Grant, Crowley não estava ciente
das teorias tântricas sobre a importância dos fluidos sexuais
femininos, ao que Grant chama de kalas. Grant descreve os kalas como
secreções psico-sexuais da suvasini tântrica, e passa a afirmar
que há 16 kalas diferentes que os praticantes trabalham com a magia
sexual e que formam as bases, juntamente com os fluidos do sexo
masculino, do Elixir. Os kalas se referem 'especificamente nos
Tantras para as vibrações vaginais provocadas por uma
intensificação do processo de ritual durante a realização dos
ritos Kaula'. (16)
Tal como mencionado, Grant rejeitou práticas sexuais anais como
pertencendo ao Décimo Primeiro grau, e em vez disso atribuiu ao
Décimo Primeiro grau a magia sexual conectada com a menstruação,
em que a mulher está ligada ao ciclo lunar de 28 dias:
O
sol e a lua são a base destas 16 emanações. No organismo humano,
eles são o macho e a fêmea. Sua energização e polarização
produz Kalas que fluem do canal genital feminino em estágios
específicos da lunação dupla que constitui o ciclo de 28 dias do
mês lunar. (17)
A
importância do Tantra e os mistérios dos kalas para a forma de
magia sexual de Grant não pode ser exagerada. Segundo Grant, o único
objetivo de sua Trilogia Tifoniana é de fato “apresentar a ciência
arcana dos kalas em termos da Tradição de Mistérios do Ocidente”.
(18)
Com isso, o desenvolvimento da magia sexual da O.T.O. Tifoniana, tal
como expresso nas obras de Kenneth Grant, faz um círculo completo
com as primeiras referências à magia sexual publicado no
Jubilaeums-Ausgabe Der Oriflamme (1912): as origens Orientais da
magia sexual da O.T.O. sugerida em Der Oriflamme (embora estas
origens devam ser consideradas espúrias) tornam-se um fato no
sentido de que as instruções secretas de magia sexual são
combinadas com ensinamentos Tântricos. Dessa forma, a magia sexual
de Kenneth Grant é um exemplo
ilustrativo de Neo-Tantra.
_________________
Notas:
Gerald
Yorke, ‘Tantric Hedonism’, The
Occult Observer
3 (1949):178-179.
Kenneth
Grant, Manifesto
of the British Branch of the Ordo Templi Orientis
(London, 1948), 1. O
manifesto não está datado, mas Grant confirmou para o presente
autor que foi divulgado por volta de 1948, depois de ter sido
reconhecido como um IXº por Karl J. Germer. Kenneth Grant para
Henrik Bogdan, 15 de novembro de 2001
Kenneth
Grant para Austin Osman Spare, 18 de Abril de 1952, reimpresso em
Kenneth Grant and Steffi Grant, Zos
Speaks! Encounters
with Austin Osman Spare
(London: Fulgur 1998), 79.
Grant
e Grant, Zos
Speaks!, 283
n. 92.
Karl
Germer para Kenneth Grant, 20 de Julho de 1955.
Kenneth
Grant para Bill Heidrick, 28 de Janeiro de 1984.
Estes
artigos foram recolhidos, juntamente com alguns artigos posteriores,
e publicado como Kenneth Grant, At
the Feet of the Guru
(London: Starfire, 2006).
Para
uma bibliografia de Grant, veja Henrik Bogdan, Kenneth
Grant: A Bibliography - from 1948 (Gothenburg:
Academia Esoterica Press, 2003).
Kenneth
Grant para Bill Heidrick, 28 de Janeiro de1984.
Grant,
Beyond
the Mauve Zone,
101.
Grant,
Remembering
Aleister Crowley,
49. Incidentalmente, Kenneth Grant dedicou esse livro para David
Curwen.
Kenneth
Grant para Henrik Bogdan, 24 de Agosto de 2004
Veja
Kenneth Grant, Manifesto
of New Isis Lodge O.T.O.
(London, 1955). Para maiores informações sobre esta loja veja ‘The
Pyramid of Power’ por Steffi Grant para o sistema de grau para a
Loja Nova Ísis juntamente com os correspondentes assuntos
esotéricos. Significativamente, o Tantra é aqui ligado à
alquimia. Kenneth Grant, Hecate’s
Fountain
(London: Skoob Books, 1992), 37. ‘The Pyramid of Power’ foi
publicado originalmente em Key
to the Pyramid
(London, privately printed, 1952) de Kenneth Grant, ou seja, três
anos antes da formação da Loja Nova Ísis.
Kenneth
Grant, Outer
Gateways
(London: Skoob Books, 1994),166-81.
Kenneth
Grant, The
Ninth Arch
(London: Starfire, 2002), 1-49.
Kenneth
Grant, Aleister
Crowley and the Hidden God
(London: Skoob Books, 1992 [19721), 211-12.
Kenneth
Grant, Outside
the Circles of Time
(London: Frederick Muller,1980), 26. Note-se
que Crowley também experimentou com elixires compostos enquanto a
parceira estava menstruada, o elixir foi, neste caso, referido como
Elixir Rubæus, ou seja, Elixir Vermelho, mas esta forma de magia
sexual era vista como uma variante do nono grau.
Kenneth
Grant, Nightside
of Eden
(London: Frederick Muller,1977), 135.
____________
©Por Henrik Bogdan – 2006
©Tradução
e revisão de Cláudio César de Carvalho – 2012
Henrik
Bogdan nasceu na Suécia e é Professor do Departamento de
Literatura, História das Idéias e Religião na Universidade de
Gotemburgo.
Se
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de Henrik Bogdan:
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